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LET'S CALL THE WHOLE THING OFF [1]

Sem nos darmos conta todos os dias temos contato com diversas culturas numa só refeição. Nosso novo país por exemplo, de identidade ainda em formação, é um literal caldeirão de diversas influências culturais e isso se reflete diretamente em nosso prato.

Isso não ocorre obviamente somente no Brasil. Hoje em dia, a grande maioria dos pratos tradicionais de diferentes países são historicamente recentes, tanto quando nós, e trazem ingredientes que só foram descobertos, comercializados e aclimatados a partir das grandes navegações dos séculos XV e XVI.

 

A exemplo, as tradicionais receitas italianas que levam tomate, um ícone associado principalmente aos molhos, só foram criadas após o descobrimento das américas, uns bons anos mais tarde na verdade. O tomate é endêmico das américas, tendo sua origem provável entre Peru e Equador, e foram os espanhóis que o levaram para a Europa e o espalharam pelo mundo.  Porém, as variedades de tomate que saíram das américas no século XVI eram amarelas, e acabaram sendo descritas e posteriormente batizadas de “Pomo d'Oro”, maçã dourada, por Pietro Andrea Gregorio Mattioli, médico e botânico italiano.

 

O tomate “tradicional europeu” com a cara que conhecemos hoje foi surgindo lentamente com a continuidade de seu já longo melhoramento genético, deixando de ser cultivado somente como planta ornamental para ganhar as panelas, acredita-se, somente no século XVIII. Entretanto muitas outras variedades ficaram para trás, e continuaram a ser consumidas ao longo das américas, e outras mais selecionadas ao redor do mundo. Hoje são cultivas cerca de 70 variedades de Solanum lycopersicum (nome científico do tomate) ao redor do mundo, de aproximadamente 10.000 variedades obtidas ao longo da história (USDA).

 

Situação semelhante à do tomate ocorreu com a batata. Você consegue imaginar a culinária germânica sem a batata ou tradicional peixe com fritas inglês sem as fritas? Apesar de hoje encontrarmos uma grande variedade de cores e formatos de batatas, como as Inglesas, Irlandesas ou Asterix, todas elas pertencem a mesma espécie, a Solanum tuberosum, e só ganharam sua “nova nacionalidade” depois de chegar a Europa.

 

Essa espécie é originária da Cordilheira dos Andes, mais precisamente da região que fica entre o Peru e a Bolívia, onde começou a ser cultivada a cerca de 7.000 anos. Os espanhóis quando invadiram a região, exterminaram os Incas, mas garantiram uma vida longa e próspera as batatas.

 

Nas mãos dos espanhóis a batata-Inca chegou a Europa na primeira metade século XVI, e se espalhou rapidamente chegando à Ásia já no início do século XVII, sendo hoje o quarto alimento mais consumido do mundo.

 

Curiosamente China e Índia são responsáveis por produzir, e consumir, 35% de toda a produção de batata mundial, enquanto cerca de 60% do tomate é produzido por China, Europa e Índia.

E assim fica a pergunta: Quão internacional é o alimento “tradicional” que você comeu hoje?

 

[1]. Música de 1937 escrita por George Gershwin's e Ira Gershwin que imortalizou a diferença de pronuncia das palavras tomato e potato por ingleses e americanos. ("You like /pəˈteɪtoʊ/ and I like /pəˈtɑːtoʊ/ / You like /təˈmeɪtoʊ/ and I like /təˈmɑːtoʊ/")

 

André Guilherme

(18/02 à 28/03/2019)

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